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Incêndios: Há risco de mais infestantes e urgência em estabilizar solos

Setembro 22, 2024 . 12:30

Incêndios: Há risco de mais infestantes e urgência em estabilizar solos

Os incêndios provocaram 135 mil hectares de área ardida e destruíram dezenas de casas

O investigador Joaquim Sande Silva considerou que, na sequência dos incêndios do Centro e Norte do país, estão criadas condições para proliferação de extensas áreas invadidas por eucaliptos e devem avançar trabalhos de estabilização de emergência dos solos.

“Poderemos vir a ter um fenómeno semelhante àquele que tivemos em 2017, de ter áreas extensas invadidas por eucalipto”, afirmou à Lusa o investigador na área da ecologia do fogo no Centro de Investigação em Recursos Naturais, Ambiente e Sociedade (Cernas), do Instituto Politécnico de Coimbra (IPC), sobre os efeitos dos incêndios ao nível da vegetação.

De acordo com Sande Silva, “Portugal é provavelmente o país da Europa com a maior ocorrência de espécies invasoras lenhosas”, que beneficiam e se expandem com a ocorrência do fogo, principalmente nas áreas mais junto ao litoral, onde predominam o eucalipto, mas também outras exóticas como a acácia e a háquea-picante.

Espécies que têm vindo a expandir-se e que, explicou o investigador, “vão causar problemas do ponto de vista da biodiversidade, mas não só”.

Após 2017, recordou, “houve problemas grandes devido à expansão do eucalipto para áreas onde nunca tinha existido, numa circunstância muito semelhante” à atual, depois de incêndios num período “muito tardio, em outubro”.

“Podemos considerar que é também muito tardio porque estamos prestes a começar o outono e, neste momento, está a começar a chover, e então isso são as condições ideais para que as sementes de eucalipto que se libertaram durante o fogo, ou após o fogo, germinem logo a seguir”, avisou.

Por outro lado, em termos de consequências para os solos, após grandes incêndios e severos, principalmente em zonas de montanha ou declivosas, após a destruição da vegetação e dos detritos chamados “folhada ou manta morta, o solo fica desprotegido”, salientou Sande Silva.

Ora, nestes solos sem revestimento vegetal como proteção e “com maior percentagem de areia”, mais facilmente mobilizados pela água, podem surgir, como no passado, “aluimentos de terra, pedras que se desprendem e, de um modo geral”, o “aumento dos picos de cheia”.

“Se houver uma chuvada, se a bacia estiver coberta, a água vai distribuindo ao longo do tempo, se a bacia não estiver coberta de vegetação a água concentra-se toda e escoa ao mesmo tempo, e vai dar origem a grandes caudais” que podem originar inundações, frisou.

Além disso, alertou também, poderá ocorrer a “degradação da qualidade da água, porque as cinzas e os minerais que resultam do processo de combustão da matéria orgânica acabam por se concentrar com valores” superiores ao aconselhável, do ponto de vista da saúde pública.

“Em anos anteriores houve, de facto, uma degradação da água para consumo público”, lembrou.

E, embora esse seja “um efeito que é temporário”, que passa com o tempo, não deixa de ser “um dos efeitos a considerar a nível do solo”.

Nesse sentido, o professor do IPC defendeu que, entre as intervenções imediatas, deve-se “fazer a chamada estabilização de emergência”, para tentar minimizar eventuais arrastamentos dos solos, antes de caírem “as chuvadas concentradas” – seja neste fim de semana ou no próximo –, tanto mais que não há tempo suficiente para “a vegetação retomar as suas características” até às grandes chuvadas de outono e inverno.

No entanto, Joaquim Sande Silva reconheceu que se a estabilização de emergência pode ser complicada com recursos privados, “porque são trabalhos onerosos e que normalmente o proprietário privado não consegue suportar”, do ponto de vista do Estado “não será tanto a capacidade financeira”, mas “a celeridade com que se conseguem mobilizar esses recursos”.

Um problema principalmente relacionado com a especialização da mão-de-obra, pois, por exemplo, nos Serviços Florestais norte-americanos, quem combate os incêndios também faz “estes trabalhos de estabilização de emergência”, assim como “a prevenção”.

“Ou seja, o fenómeno fogo não está espartilhado por várias instituições, como está no nosso país, portanto, está concentrado nos Serviços Florestais, que coordenam tudo e, portanto, fazem todas as fases dos diferentes processos que ocorrem, quer na fase preparatória, antes da época de incêndios, quer o combate, quer depois nos trabalhos de reabilitação”, precisou, defendendo uma maior especialização de unidades de prevenção e combate aos fogos rurais.

Sete pessoas morreram e 177 ficaram feridas devido aos incêndios que atingiram, desde dia 15, sobretudo as regiões Norte e Centro do país. A Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil contabiliza cinco mortos, excluindo da contagem dois civis que morreram de doença súbita.

Os incêndios provocaram 135 mil hectares de área ardida, segundo o sistema europeu Copernicus e destruíram dezenas de casas.

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