Caso gémeas: Neuropediatra rejeita responsabilidade na marcação das primeiras consultas
A neuropediatra Ana Sofia Moreira Sá, que está hoje a ser ouvida na comissão parlamentar de inquérito ao caso das gémeas luso-brasileiras por alegadamente ter marcado as consultas, disse que não teve "responsabilidade nenhuma" no agendamento.
"Não tive responsabilidade nenhuma pela marcação das consultas", disse, depois de ter sido questionada pela deputada do BE Joana Mortágua.
No entanto, a médica esclareceu que o pedido de marcação de consultas não deu entrada no sistema.
"Os pedidos têm de ter entrada no sistema. Independentemente disso, se tivesse sido inserido havia uma indicação da marcação. Eu pedi para verificar, eu não triei essas consultas", disse a médica.
Em causa está a marcação das primeiras consultas das gémeas luso-brasileiras tratadas com um dos medicamentos mais caros do mundo no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, em 2020.
"Houve uma marcação de consulta. Os detalhes não sei dizer. Há triadores principais e outros triadores. Os principais eram eu e António Levy", coordenador do Serviço de Neuropediatria do Hospital de Santa Maria, disse Ana Sofia Moreira Sá.
Ao deputado do Livre Paulo Muacho, a médica garantiu que não houve "uma pressão direta vinda do secretário de Estado [António Lacerda Sales" e "todos os dias há consultas do amigo ou do primo".
"O pedido, muitas vezes, não é feito por pressão e é comum que as pessoas perguntem se podemos fazer uma consulta. Temos muitos pedidos de consulta. […] É muito português. O primo vem pedir. É muito comum", justificou.
Ana Sofia Moreira Sá, que é coautora da carta dirigida ao então diretor clínico do Centro Hospital de Santa Maria a contestar o tratamento, explicou que o texto surgiu para demonstrar desconforto por pessoas não-residentes no país terem acesso ao Serviço Nacional de Saúde (SNS).
"O desconforto vem de [haver] pessoas que não são sequer residentes em Portugal e que arranjavam forma de ter terapias que não conseguirão no seu país. Pareceu-me abrir uma porta complicada", salientou.
Já em resposta ao Chega, a especialista referiu que o pedido para estas crianças “foi diretamente para que viessem cá fazer a terapêutica”, o que “do ponto de vista legal e económico ia ser complexo e criava dilemas para os médicos”, e indicou que “haviam boatos” no hospital de que “teria havido alguma pressão para a marcação”, mas disse não saber por parte de quem.
A clínica disse que se comentava na unidade hospitalar que os pais das crianças "não pensavam em viver" em Portugal.
"Como médicos queremos tratar de todos os doentes. Não podemos recusar, mas do ponto de vista económico percebemos que é muito complicado para o país", sublinhou.
Interpelada pela deputada do PSD Ana Santos sobre se a regras para a marcação da primeira consulta foram cumpridas, Ana Sofia Moreira Sá disse que, “à luz das normas de hoje, não”, considerando que “devia ter sido registada no processo de triagem”.
Já em respostas ao PS e à IL, a médica disse que os pedidos de consulta acontecem “desde pessoas com cargos mais elevados até pessoas que têm cargos mais baixos” e até através de e-mails enviados diretamente ao hospital pelas famílias das crianças, e referiu que todos são acedidos.
A neuropediatra classificou a lista de espera como “bastante rápida”, indicando que tentam que “não ultrapasse os três meses”, e salientou que um “doente urgente é visto primeiro do que doente que tenha sido pedido de alguém” e que “isso nunca representa colocar um doente urgente para trás”.
“Posso assegurar de certeza absoluta que não vão tirar o lugar a alguém que precisa de uma consulta mais urgente, isso não acontece. […] Não vamos deixar de marcar um doente que precisa de uma consulta urgente para marcar outra pessoa” a pedido de alguém, garantiu.
Ana Sofia Moreira Sá alertou, no entanto, que “há muitos doentes que não têm médico de família e não têm a quem pedir a marcação de consulta”.
A médica afirmou também que “não houve” crianças que ficaram por tratar na altura no Hospital de Santa Maria.