Contrato-promessa: a nulidade em debate
O contrato-promessa é uma figura do nosso ordenamento jurídico com bastante relevância, previsto nos termos do artigo 410.º do Código Civil (CC) e o qual se traduz na “convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato”, sendo-lhe aplicável “(...) as disposições legais relativas ao contrato prometido, exceptuadas as relativas à forma e as que, por sua razão de ser, não devam considerar extensivas ao contrato-promessa”. Portanto, na sua essência, o contrato-promessa configura-se como um contrato dotado de eficácia real ou meramente obrigacional, no qual as partes, ou porventura, apenas uma delas, se vincula à obrigação de celebrar um contrato futuro – denominado de contrato prometido. Nasce, assim, deste primeiro contrato, uma obrigação de facto positivo, que consiste na emissão de uma declaração negocial, a qual corresponderá ao contrato definitivo.
Recentemente, o Tribunal da Relação de Coimbra, num Acórdão de 26/11/2024, incidiu a sua decisão sobre uma temática importante, especificamente, o reconhecimento presencial das assinaturas quando está em causa a compra e venda de bens imóveis, ou seja, a celebração de um contrato oneroso de transmissão de um direito real sobre o edifício. Nestes casos em particular, quanto às formalidades necessárias para a sua celebração, aplica-se o disposto no n.º 3 do artigo 410.º do CC, ou seja, exige-se o reconhecimento presencial das assinaturas, requisito este que não foi observado no caso em apreço, visto que as partes estabeleceram no respetivo contrato uma “cláusula de renúncia” dispensando a observância deste requisito formal.
Ora, o acórdão supra mencionado abordou, de forma minuciosa, as teses jurisprudenciais sobre a matéria, ponderando a sua decisão nos princípios de boa-fé, confiança no tráfego jurídico, bem como o formalismo legal exigido para estes negócios jurídicos. Se, por um lado, verificamos uma corrente que defenda a admissibilidade da renúncia, considerando-a um direito disponível das partes, por outro lado, a posição adotada pelo TRC sustenta que tal renúncia viola a ordem pública social – “por contrariar uma norma de interesse e ordem pública, que pretende defender os promitentes compradores – normalmente a mais fraca – contra a sua fraqueza negocial”.
Assim, conclui o referido acórdão que esta omissão - designadamente, a preterição do requisito do reconhecimento presencial das assinaturas -, acarreta a nulidade jurídica do contrato em apreço, não obstante a existência de renúncia prévia no contrato-processo, podendo, deste modo, invocar-se o abuso de direito.
A presente decisão judicial reveste uma relevante importância, porquanto reforça a segurança jurídica no âmbito das transações imobiliárias e consolida uma interpretação restritiva das exceções às formalidades legais.