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Defesa de ex-comandante da Base de Ovar acusado de abuso de poder reclama inocência
O advogado do ex-comandante do antigo Aeródromo de Manobras N.º 1 de Ovar reclamou hoje inocência do seu cliente, que está acusado de abuso de poder, num caso que terá causado um prejuízo ao Estado de 200 mil euros.
O coronel José Nogueira, atualmente na reserva, começou hoje a ser julgado no Tribunal de Aveiro, juntamente com mais seis militares de diversas patentes que à data dos factos se encontravam com vínculo à Força Aérea Portuguesa, incluindo oficiais e assistentes operacionais.
Os arguidos estão acusados dos crimes de abuso de poder, peculato, peculato de uso, recebimento indevido de vantagem e denegação de justiça e prevaricação.
Com exceção do tenente-coronel Francisco Cordeiro, que à data dos factos era o número dois da unidade, substituindo o então comandante na sua ausência, todos os arguidos optaram por ficar em silêncio na primeira sessão do julgamento.
Nas disposições introdutórias, o advogado do ex-comandante explicou que as decisões do seu cliente “foram legítimas, justificadas e dentro do quadro normativo legal”, negando que tenha existido qualquer vantagem pessoal.
“Todas as suas ações de comando foram continuamente escrutinadas através de inspeções técnicas conduzidas pela Inspeção-Geral da Força Aérea”, disse o advogado nas disposições introdutórias, afirmando que “nunca houve um procedimento que levantasse uma sombra” sobre o seu comando.
O causídico referiu ainda que a acusação do Ministério Público (MP) é “baseada em suposições e distorções da realidade”, na sequência de uma denúncia anónima que procurou “distorcer instruções legítimas, transformando atos administrativos rotineiros em suspeitas infundadas”.
Deu como exemplo a aquisição de dois colchões para a casa de função do comandante, para substituir outros dois que tinham mais de 20 anos, e que, supostamente, é “o eixo central do alegado abuso de poder”.
O advogado alegou que esta aquisição foi realizada quase no final do comando do coronel José Nogueira, "segundo os procedimentos habituais, dentro das normas e através de receitas da unidade", e afirmou que os colchões permaneceram no local, fazendo parte do inventário oficial.
“Como pode então falar-se em vantagem patrimonial indevida? Onde está o beneficio pessoal do coronel se os bens adquiridos não são da sua propriedade, nem foram utilizados fora do âmbito da sua função”, questionou, adiantando que tudo não passa de uma tentativa de prejudicar um oficial exemplar.
Os factos criminosos remontam ao período entre outubro de 2018 e abril de 2021, quando o principal arguido desempenhou as funções de comandante do Aeródromo de Manobras AM1 em Ovar, no distrito de Aveiro.
A acusação do MP refere que o coronel obteve benefícios ilegítimos para si e para a sua família e recebeu ou proporcionou vantagens indevidas a outros militares e trabalhadores civis da unidade, causando um prejuízo ao Estado de quase 200 mil euros.
De acordo com a investigação, o arguido autorizou e justificou indevidamente ajustamentos a inventários de balanço de géneros alimentares da messe do AM1, a que correspondeu um “desvio absoluto” de cerca de 120 mil euros.
A acusação refere ainda que o antigo comandante não comia na messe, tendo dado indicações para que as suas refeições fossem transportadas diariamente para sua casa, assim como as da mulher e do filho, que não tinham direito a alimentação por conta da Força Aérea, o que se traduziu numa vantagem patrimonial indevida de cerca de 17 mil euros.
Durante o período em causa, o ex-comandante terá ainda recebido na sua casa géneros alimentares e artigos diferenciados, normalmente não consumidos na messe, incluindo vinho da marca “Papa Figos” e bebidas espirituosas, fruta diferenciada, como papaia e manga, bolos, chocolates, sumos, água com gás, queijos, manteiga, molhos, temperos e vegetais, num valor de quase 14 mil euros.
O oficial também terá solicitado e recebido leitões nas festas de Natal de 2019 e 2020 e na festa de aniversário de um dos seus filhos, tendo ainda proporcionado trabalho suplementar a trabalhadores civis da messe em atividades e festas pessoais, cujo custo foi suportado pelo AM1.
O MP requereu que os arguidos sejam condenados a pagar ao Estado cerca de 238 mil euros, correspondente ao prejuízo causado, tendo ainda ordenado a extração de uma certidão para remeter ao Tribunal de Contas para eventual apuramento de responsabilidade financeira.