
Intervenção junto ao Memorial do Conhecimento criticada
Um arranjo urbanístico do Largo da República, em Vieira de Leiria, Marinha Grande, interfere com a apreciação do Memorial ao Conhecimento, criado contra a ignorância e em homenagem à República, considerou o autor dessa obra escultórica.
A intervenção decidida pela Junta de Freguesia de Vieira de Leiria resultou na recente instalação de várias colunas nos acessos do jardim que levam até à escultura imaginada e criada por Fernando Crespo e inaugurada em 2020.
Contactado pela agência Lusa, o artista disse não ter sido informado nem consultado sobre a intervenção, assumindo-se perplexo com o sucedido.
“A escultura com seis metros de altura está agora aprisionada por dezenas de colunas e travessas brancas com pouco mais de dois metros de altura que a cortam a meio e impedem a sua visualização”, lamentou.
A instalação das estruturas “destruiu a dimensão da praça e o seu elemento de referência - a escultura -, também designado premonitoriamente ‘Manifesto contra a ignorância”, acrescentou Fernando Crespo.
O artista explicou que o registo fotográfico panorâmico da obra é “agora impossível” e considerou que o trabalho se afigura agora como “uma presença inusitada, cercada pelo folclore envolvente”.
“Não é preciso ler nenhum tratado de Vitrúvio”, arquiteto romano autor do texto fundador da arquitetura moderna, “para entender o que está aqui em causa”, considerou.
Diferente opinião tem o presidente da Junta de Freguesia de Vieira de Leiria, Álvaro Cardoso.
“A escultura em nada é prejudicada. Nós, executivo, achámos que o Largo da República devia ser requalificado e dar-lhe uma nova roupagem, atendendo a que se pretendia, à semelhança do que acontece em outras vilas e outros concelhos, embelezá-lo”.
O autarca detalhou à Lusa que a intenção é requalificar a praça “ao nível natural e ambiental com plantas, nomeadamente buganvílias”.
“Para o efeito, pensámos e executámos uma pérgula - no fundo o que lá estão são pérgulas - com esse mesmo intuito. É uma intervenção perfeitamente normal”.
À junta de freguesia não chegou nenhuma reclamação formal, mas Álvaro Cardoso admitiu ter ouvido fregueses descontentes com a requalificação, sobretudo pela quantidade de colunas.
“Obviamente nunca se consegue agradar a toda a gente. Há pessoas que gostam e outras que não gostam. Mas não tem havido manifestações contra a intervenção”.
O presidente da junta considerou que “o real impacto do ponto de vista de imagem e ambiente” do projeto para o Largo da República apenas se verá “quando as buganvílias se desenvolverem”.
“Tem de se obedecer ao seu tempo de maturação. Serão necessários dois ou três anos, depende do ritmo de crescimento. Temos de dar tempo ao tempo”, notou Álvaro Cardoso.
Sobre a relação entre a intervenção e a obra de arte de Fernando Crespo, o autarca considerou que “a escultura não é em nada prejudicada”: “Ela pode ser admirada de vários pontos no largo. São compagináveis as duas situações. Também há lá pinheiros mansos, um painel eletrónico e outros equipamentos que, se analisarmos por esse sentido, também obstaculizam a [visão da] escultura”.
Álvaro Cardoso garantiu apreciar a obra de arte e o seu simbolismo.
“Gosto da obra e trabalhei muito para se concretizar, como sabe o Fernando Crespo. Não foi um processo fácil, entre a autarquia e os autores do projeto. Se não tivesse outras intenções que não fosse embelezar o espaço, não vinha agora prejudicar uma obra que tanto custou a implementar”.
O artista, por seu lado, disse não entender a atitude dos técnicos municipais, “tão rigorosos aquando da proposta da colocação da peça”, mas que, agora, “abriram mão de critérios paisagísticos básicos”.
“Esta escultura nunca seria implantada no lugar onde está se ali estivesse na época esta estrutura incaracterística e ‘kitsch’. Assim, o que justifica a sua pertinência e edificação naquele espaço agora?”, concluiu.