
Pena suspensa para antiga funcionária do SEF de Leiria
O Tribunal de Leiria condenou na terça-feira uma antiga funcionária do extinto Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) na pena única de três anos de prisão, suspensa na sua execução, por 17 crimes de abuso de poder.
A suspensão é por igual período e sujeita a regime de prova, de acordo com o acórdão ao qual a agência Lusa teve acesso.
O coletivo de juízes considerou provado que a arguida, de 47 anos, deu tratamento preferencial a cidadãos estrangeiros de nacionalidade chinesa “em detrimento dos demais em igualdade de condições, que tinham de aguardar longos períodos de tempo, normalmente vários meses, para conseguirem vaga para atendimento numa direção ou delegação regional do SEF”.
No acórdão, lê-se que a funcionária pública, que esteve em mobilidade durante cerca de 15 meses na delegação de Leiria do SEF, submeteu “pedidos de autorização de residência/renovações de autorização de residência no sistema informático do SEF”, registando “os documentos necessários à instrução desses pedidos, as taxas devidas” e as faturas correspondentes, “sem que os requerentes tivessem atendimento agendado para esse dia e nessa delegação”.
“Para o efeito, a arguida, munida da documentação necessária e dos requerimentos já previamente preenchidos e assinados, que recolhia junto dos interessados ou de terceiros, procedia à inserção dos requerimentos e dos documentos, ao registo das taxas e emissão das faturas (…), importando do próprio sistema informático do SEF os dados biométricos dos requerentes, já arquivados por força de anteriores interações com o SEF, assim obviando à sua presença, que sabia ser obrigatória”.
Entre outros casos, o tribunal coletivo referiu o de um cidadão chinês residente em Matosinhos (Porto) que, “na sequência de solicitação de pessoa não concretamente identificada” e “sem que existisse qualquer agendamento” em seu nome, a arguida, antes da abertura ao público da delegação de Leiria, tratou da autorização de residência daquele.
Outra situação prendeu-se com uma cidadã chinesa residente na Costa da Caparica que tinha agendamento para atendimento no SEF de Setúbal em novembro de 2019, mas, a pedido de pessoa não identificada e “sem que existisse qualquer agendamento” em Leiria, a arguida inseriu, quatro meses antes, no sistema informático do SEF, o requerimento de autorização de residência daquela.
Segundo a deliberação, a funcionária pública, sem antecedentes criminais e que não teve processo disciplinar, atuou com a intenção de beneficiar indevidamente cidadãos de nacionalidade chinesa “em detrimento de outros cidadãos estrangeiros que, nas mesmas condições, tinham de se sujeitar à disponibilidade de vagas”.
“(…) Ao assim atuar, violava os deveres inerentes às suas funções públicas, a que sabia estar vinculada, designadamente os deveres de isenção, imparcialidade e defesa do interesse público, beneficiando” cidadãos que “lograram obter autorizações de residência/renovações de autorizações de residência de forma mais rápida, sem se sujeitarem às limitações inerentes ao número de vagas para atendimento e, em alguns casos, sem se deslocarem aos serviços do SEF, o que se traduziu em benefícios que a arguida sabia serem ilegítimos”, acrescentou.
A funcionária pública negou, nas declarações finais ao tribunal, a prática dos factos, sustentando “ter sido vítima de uma cabala” e alguém “ter usado, sem a sua autorização e conhecimento, a sua senha de acesso ao sistema”, mas tais declarações não mereceram qualquer credibilidade com o coletivo de juízes a considerar serem frontalmente contrárias à demais prova produzida.