Saber Entristecer
Há uns tempos, li, algures, que a Disney iria fazer um remake do Bambi, no qual retiraria cenas relacionadas com a morte da mãe do famoso cervo, alegadamente pelo facto ‘dos pais estarem mais sensíveis’, evitando aquele que terá sido um trauma de gerações (esta é a parte em que recorro ao meu emoji favorito: aquele com os olhos esbugalhados).
Quando as ideias de cancelamento chegam aquilo que temos de mais instintivo - as emoções, o caso só pode estar ‘mal parado’. Criar redomas à volta de pais e filhos, em circunstâncias como estas, não é cuidar ou atender à sua sensibilidade. É, antes, evitar e desaproveitar pequenas oportunidades para, a pouco e pouco, trabalharmos competências essenciais de autorregulação. O medo, a tristeza ou a raiva, mesmo sendo ‘desagradáveis’ de sentir, são emoções básicas que fazem parte da nossa paleta de expressões, com um importante propósito adaptativo. Se pararmos para refletir sobre isto, depressa concluímos que é o medo que nos afasta de perigos, que é a raiva que nos impele para a auto-defesa ou que é a tristeza que mapeia como significativa uma reação de perda ou de frustração perante um ‘inconseguimento’ da vida.
Entristecer e permitirmo-nos fazê-lo sem culpa, nestes tempos em que parece mal assumirmos a nossa vulnerabilidade, encerra, em si mesmo, um ato de coragem, sinceridade e sabedoria (por vezes, até me apetece sair à rua, numa manifestação mais ou menos solitária, empunhando um cartaz com a frase, escrita em letras garrafais: ‘Fragilidade não é fraqueza’)!
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